Amadurecimento


Todos eles querem o impossível, isto é, as condições da existência burguesa sem as consequências necessárias dessas condições. Nenhum deles compreende que a forma burguesa de produção é histórica e transitória, da mesma maneira que a feudal. Este erro decorre do fato de o homem burguês ser para eles a única base possível de toda sociedade; não conseguem imaginar uma sociedade na qual os homens tenham deixado de ser burgueses.

    Karl Marx


Ouvir meus colegas de trabalho resmungarem sobre “o que está errado com o mundo” é uma experiência difícil. Há um vago sentimento de que a organização atual da sociedade está caminhando rumo à catástrofe, mas a noção que acompanha esse sentimento é de que seremos reduzidos a “nos alimentar de nozes” (um cenário predileto), como se o colapso das formas-fetiche significasse a evaporação da riqueza material, como se os vegetais que estamos embalando não fossem comestíveis (e não pudessem crescer) sem suas etiquetas de preço.

Os fetiches do dinheiro e do Estado-nação parecem tão totais que até mesmo os desejos e demandas mais desvairados que meus colegas expressam se encaixam perfeitamente em seu horizonte. Eles querem mais dinheiro para si mesmos, para o “povo” que “merece” (sem conversas de como gostariam de viver — a necessidade do dinheiro é a única necessidade verdadeira produzida pelo sistema econômico, e sua quantidade é sua única qualidade efetiva). E querem que o governo faça “coisas úteis” para essas “povo” merecedor (presumidamente um povo delimitado nacionalmente), ao invés de servir aos interesses da “ganância corporativa”.

As suposições de que, independentemente do que for, teremos que “trabalhar para sobreviver” (mesmo que pelo sonhado salário melhor), e que sempre deverá existir um “eles” que “nos” prestarão serviços e nos governarão “em nosso interesse” exemplificam a estranha mistura de hiperativismo impensado (a “ética profissional”) e a passividade estreita que constitui o tipo antropológico do homem burguês, ainda mais acentuadamente na era de sua decomposição longa e agonizante.

Não sei como dizer aos meus colegas de trabalho: Eu não quero mais dinheiro, quero acesso incondicional aos meios de vida sem relação ao tempo de trabalho ou à troca, e, Eu não quero um “governo” melhor acima de nós, eu quero que todos tenham controle sobre e reponsabilidade pelo contexto e conteúdo de sua própria vida. Eu posso sugerir coisas assim, quando consigo aguentar participar de conversas deste tipo, mas reluto em lhes dizer abertamente; tenho medo de que me dirão que sou louco, e que isso é impossível, “utópico”. E suponho que seja, para o homem burguês.

O sonho de um trabalho assalariado que pague mais e um Estado melhor sugere que se está disposto a continuar a realizar trabalho entediante e frequentemente claramente sem sentido por mais de 40 horas por semana (e ser grato por isso — os realmente infelizes não conseguem nem achar um explorador), mas indisposto a participar na constituição e execução de decisões importantes sobre a vida e o funcionamento da sociedade. O comunismo — isso é, a liberdade — ao mesmo tempo pede menos e mais dos seres humanos, e é por isso que se tem medo dele, tanto medo que mal se pode pensar nele. Aqueles de nós que pensamos nele estão um pouco desconfortáveis com a perspectiva. Honestamente, tendo sido socializado não-socialmente, me conforto no fato de que meu único vínculo real com a sociedade está quietinho na minha carteira; que, contanto que eu pague meu aluguel e minhas contas, quando eu sair do trabalho (o único momento que eu inquestionavelmente tenho que interagir com pessoas), eu posso me jogar no sofá e não falar com uma alma e não pedirão nada a mim.

A recompensa do capital por nosso trabalho é o alívio da liberdade — assim que saímos do trabalho, tendo desempenhado o papel do “adulto trabalhador bem-integrado” pelo tempo exigido, podemos retornar ao estado dependente e infantil do espectador. O fim do trabalho é aterrorizante porque também significa o fim do lazer (ao menos em sua forma “estúpida” atual como antítese abstrata do trabalho). A preocupação “mas o que faríamos com todo o tempo livre?” encara a preocupação “mas quem cuidaria de tudo?” ao longo do silêncio desconfortável da óbvia resposta indizível. O comunismo significaria aflorar e deixar para trás a imaturidade auto-imposta do homem… e ninguém quer crescer.



Traduzido do inglês por Proelium Finale




A New Institute for Social Research